A pergunta surge imediatamente: Por quê? Por que acontecem estas coisas e justamente ali onde mais danos promovem?
Não somos especialistas na leitura e interpretação das Leis da Natureza, mas podemos oferecer algumas simples hipóteses decorrentes dos conhecimentos tradicionais.
Não devemos acreditar que esses fenômenos são produto exclusivo de nossa época. Sempre existiram, ainda que nem sempre tenhamos guardado memória deles, ou talvez àqueles distantes desastres hoje confundamos com mitos. Aliás, não foram as bárbaras catástrofes que assinalaram a passagem de um período a outro da longa história do planeta? E o que dizer dos rastros de histórias segundo as quais velhos continentes – como Lemúria e Atlântida – foram tragados pelo fogo e pelas águas? Como explicar essas violentas glaciações que, aparentemente, atingiram homens e animais desprevenidos, alguns dos quais ficaram congelados enquanto faziam a digestão das ervas mastigadas? O que aconteceu com tantas espécies de vegetais e animais desaparecidas repentinamente? E o que dizer das cidades das quais ficaram apenas rastros, ou às vezes nem sinais, exceto os relatos daqueles tempos? O egocentrismo humano nos faz ver o problema de hoje como único e maior, mas não é assim.
Pelo que sabemos, estas catástrofes afetam a vários pontos da Terra, só que aqueles mais favorecidos pela sua riqueza material se recuperam antes e a destruição é solucionada relativamente cedo, o suficiente para cair mais rapidamente no esquecimento.
Pelo contrário, quando o cataclismo cai sobre as zonas mais miseráveis, a recuperação é lenta, muito lenta. Ao menos, e como contrapartida, desperta-se a compaixão e a solidariedade dos povos, movem-se as vontades de ajudar e os meios de comunicação ampliam muito mais o sucesso. É lamentável pensar mal desses casos, mas não podemos deixar de nos perguntar até que ponto alguns desses movimentos de cooperação não tratariam de lançar uma discreta cortina de fumaça sobre delicadas situações de corrupção social, política, moral, econômica, que assim ficam deixadas a um segundo plano momentâneo.
A Terra está velha e enferma, assim dizem as antigas tradições. Seus sintomas são cada vez mais evidentes e o que vemos como calamidades são apenas as queixas do planeta. E a isso há que se somar os efeitos nocivos que produzem os seres humanos em sua inconsciência e em sua ambição desmedida, certos de viver em uma rocha insensível e inextinguível.
Em um aspecto sim acertamos: em chamar de “naturais” a estas catástrofes. Não são produtos do homem… Até certo ponto.
A Terra possui regiões mais frágeis; aquelas onde a densidade populacional é maior dentro de um espaço comparativamente pequeno. Essa mesma densidade – se não se trata de poderosas capitais – fala de escassos meios econômicos, de superlotação sem remédio fácil. Qualquer desastre, nestas condições, assume proporções descomunais.
A Terra tem áreas frágeis: istmos, pequenas faixas encerradas entre dois mares, terras baixas em afundamento progressivo, vulcões sempre ativos, falhas tectônicas entre placas continentais, ruptura da camada de ozônio, chuvas torrenciais junto a secas incontroláveis, extremos de frio e de calor, fenômenos como o El Niño que de repente se intensificam e arrasam à sua passagem. Se conseguíssemos olhar nosso corpo com os mesmos olhos, comprovaríamos que também temos alguns pontos frágeis onde é muito mais fácil que uma agressão ou enfermidade se manifestem de forma mais cáustica. Temos perdido o sentido da geografia sagrada. Hoje se vive e se constrói em qualquer lugar e de qualquer maneira. Desconhecemos aqueles locais onde as possibilidades de ocupação são mais positivas porque ali confluem energias benéficas de distinto tipo. Constrói-se segundo a moda, com uns estilos arquitetônicos que, apesar de seus sistemas de segurança, desafiam a estabilidade e a estética. Ou se constroem tristes casebres que não resistem nem ao vento nem à chuva, porque não há outra forma de encontrar um teto, se é que se pode chamar de teto a essa obra desmantelada.
Por que queixar-se então se temos levantado acampamentos sobre um formigueiro ou um ninho de escorpiões sem saber? Faz muito tempo que perdemos a capacidade de falar com a Natureza. Justamente as pessoas simples e humildes que outrora sabiam manter esse íntimo contato hoje se afastaram e esqueceram dessa comunicação, trocando-a pela áspera luta de classes e pelas reivindicações iradas que não carecem de razão em absoluto, mas que não estabelecem nenhum vínculo com a Terra.
Isto não quer dizer que falar com a Natureza seja pedir-lhe o que deve fazer para que estejamos contentes. Significa penetrar nela, compreendendo-a em suas expressões e conseguir, por consequência, que também nos compreenda. É criar a união entre ambas as partes, uma amizade recíproca, e não esperar que a Natureza esteja ao serviço permanente do homem e de suas necessidades e caprichos.
A humanidade também está velha, cansada, carente de grandes ideais e decepcionada. Claro que existem exceções, mas no geral é assustador. Há tanta violência sem sentido que não se deve estranhar que se a exerça contra os próprios homens e, por que não, contra a Natureza.
Assim como está, sem nenhuma mudança a vista, o diálogo entre os dois velhos, a Terra e a humanidade, é impossível.
É a humanidade que deve esforçar-se por converter seu envelhecimento em experiências úteis, sua decepção em um diálogo com a Natureza para saber algo mais de suas leis. Isto não garante a desaparecimento das catástrofes, mas sim seu conhecimento prévio, sua prevenção, a comunhão direta com essa grande e poderosa casa que nos acolhe e a possibilidade real de atenuar os males humanos e – por que não – os da Terra.
Afinal, estas são catástrofes naturais, e tudo o que é natural tem também uma via natural de solução.
Autor: Délia Steinberg Gúzman
Créditos das imagens: Uwe Gille